quarta-feira, dezembro 08, 2004

Portas

Faz um ano e meio que moro ali na Francisco Leitão.
São três apartamentos por andar e sei que ali no nono andar somos três mulheres.
Levei mais de mês para ver a cara de cada uma das outras duas... Não me pareceram amigáveis e também não fiz questão de ser sociável.
A mulher que mora no apartamento da frente tem cara de estar na casa dos 40, já beirando os 50. A vizinha do lado aparenta 30 e poucos e, julgando por suas músicas, tem mesmo: acorda escutando Like a Virgin ou Blitz... Eu tô aqui com meus 26. Ou seja, temos uma diferença de uma década pra cada, mais ou menos.
Não somos amigas, mas eu já sei um bocado de coisas sobre elas e elas, se forem boas observadoras, também sabem umas certas coisas sobre mim.
A vizinha da frente tem um namorado. É um senhor baixo e meio careca, com cara de ter uns 50 e poucos. Assim como a namorada, não é de conversa. Os dois adoram trocar beijos estalados ali no corredor. Não é todo dia, mas os domingos são recorrentes. Ele vai embora depois das 10 da noite e, enquanto o elevador não chega, os dois ficam lá num beija-beija que, ao invés de me dar vontade de beijar, causa até um certo mal estar, dado a barulheira que o corredor insisti em fazer ecoar. Toda manhã ela recebe a Folha de São Paulo. Antes das 7 o jornal já está ali, mas às vezes ele fica em cima do capacho até bem depois do meio-dia e acho até que a assinatura talvez seja do namorado...
A moça do lado adora Coca-Cola normal e esvazia latas e latas e garrafinhas de 600ml toda semana. São dois sacos brancos de lixo reciclável cheios de latas e garrafas toda semana. Ela também adora pizza e comida chinesa e quase toda noite o moço da entrega aperta sua campainha. O cheiro às vezes é bem bom e horrível pra quem quer perder seus quilinhos a mais. Um casal de amigos sempre aparece por lá, mas vão embora cedo, antes das 10. Agora, parece que eles sumiram e tenho escutado alguns beijos vindos do corredor, encostados à minha porta. Acho que ela tá namorando também.
Resta a porta da minha sala. Ali ninguém tem saído à noite e recebido beijos antes de entrar no elevador. Também não tem capacho nem jornal na minha porta. Acho que é a porta mais triste e a única que ainda não tem uma guirlanda ou um Papai Noel. Talvez seja culpa dos 20 e poucos e da falta de crença que Papai Noel vá me trazer um bom presente este ano.
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