quarta-feira, dezembro 22, 2004

Desfazendo as malas

Semana passada foi a hora de arrumar tudo o que já havia feito durante o ano, amarrar as pontas e deixar tudo meio organizado para janeiro, quando volto a trabalhar. Assim, foi uma semana menos de coisas novas e muito mais de esforços investidos em coisas antigas não finalizadas.
Também foi uma semana em que a dieta ficou de lado e as cervejas com os amigos foram bastante constantes na vontade de aproveitar aqueles últimos momentos que teríamos juntos em 2004.
Fiz tudo dentro do prazo que havia me estabelecido e até mais rápido que ele, na verdade, tanto que, no sábado, já podia fazer as malas e vir pra Andradas.
E fiz. E vim. Mas não foi fácil... É engraçado perceber isso.
Há alguns anos, fazia minhas malas de fim de ano com semanas de antecedência e ansiava loucamente pela hora em que pusesse a cara na estrada rumo ao sul de Minas. Chegava a riscar as semanas em um calendário improvisado no meio de um caderno qualquer, contando dias que ainda teria em São Paulo e semanas que restavam antes de minhas férias em Andradas.
Sábado foi diferente: fiz as malas de modo quase mecânico, desejando descanso de férias, mas, ao mesmo tempo, não me entusiasmando pelos dias que passarei em Andradas. É claro que é bom vir pra cá e ver todo mundo e curtir a calma que minha casa me traz, mas no sábado só pensava nos dias em que aqui ficarei e nas poucas opções de diversão que a cidade pode me oferecer. Sentia que, vindo para cá, estava assinando a conta e fechando o ano para baladas e diversões com amigos.
Não sei se pra vocês isso faz algum sentido, mas pra mim representa algo que já vem acontecendo há um bom tempo: mudei meu endereço, mas mudei minha vida também.
Tá! Podem dizer que é papo de fim de ano, que estou fazendo um balanço de tudo o que se passou e coisa e tal. Não nego. É um balanço sim, mas não só de fim de ano. É um acerto comigo mesma. Revi muito de mim mesma, aceitei várias coisas que não acreditava até então e vejo que, agora, ao fim de 2004, não sou nem mais a sombra da menina que saiu de Andradas em fevereiro de 1998, ansiosa e apreensiva com o que iria encontrar em São Paulo, na USP, pelo seu futuro.
Ainda não sei o que acontecerá daqui a alguns dias (é claro!), mas tenho muita certeza de que as malas arrumadas com um entusiasmo não muito digno de seu nome demonstram, agora, que elas pertencem mais a São Paulo do que a Andradas. E que elas só ficam bem desfeitas aqui durante as férias e guardadas em cima do meu guarda-roupas lá em Pinheiros durante todo o resto do ano.

terça-feira, dezembro 14, 2004

Romantismo me parece uma amostra de carinho, bem-querer e amor que se faz com uma certa intenção de se mostrar aos outros o que se sente.
Há os românticos tímidos que somente demonstram o que sentem em situações absolutamente privadas e íntimas e há os que demonstram tudo para todos, sei lá se buscando a aprovação ou inveja dos outros.
O romantismo também me parece estar ligado a declarações de amor ou de ardente paixão.
Olhando assim, fria e logicamente, dirão alguns que o que farei abaixo é uma declaração de amor romântica e exibicionista. Não concordo com tudo, mas de fato é uma declaração de amor que foi tímida o suficiente para não ser entregue a um, mas, ao mesmo tempo, tem coragem de exibir-se para vocês que a lêem.

Às vezes me sinto mal pela postura negativa que assumo frente à vida. Sou pessimista e gosto bem de reclamar de coisas pequenas que me aborrecem. Ultimamente, então, tenho me esmerado nessa arte e, agora, umas vezes me peguei a chorar por coisas tão insignificantes para muito, mas tão dolorosas para mim.
E aí é que você entra: você me traz conforto para o mar de confusões e incoerências pelo qual anda meu pensamento. Você é doce sem exagero, amargo muitas vezes, mas só vejo coisas boas quando estou com você. E se você não está onde sei que você deveria estar, vêm a ansiedade e a vontade de que estivesse só para que eu pudesse falar um oi ou contar alguma coisa sem importância, dessas coisas que a gente considera tão irrelevantes que só conta para gente mesmo ou para quem a gente gosta muito, porque, para mim, quando a gente gosta mesmo a gente não precisa mais se mostrar como aquele com que tudo dá certo, para quem tudo é interessante e para quem a vida acontece em alta voltagem. Não. Quando a gente gosta de fato, a gente quer compartilhar também as coisas pequenas das quais a vida está cheia mas que só alguns dão atenção.E você me dá, sempre, muita atenção de um modo que eu gosto de receber: sem exageros tolos, sem cuidados e mimos desnecessários, mas em boas doses verdadeiras.

quarta-feira, dezembro 08, 2004

Portas

Faz um ano e meio que moro ali na Francisco Leitão.
São três apartamentos por andar e sei que ali no nono andar somos três mulheres.
Levei mais de mês para ver a cara de cada uma das outras duas... Não me pareceram amigáveis e também não fiz questão de ser sociável.
A mulher que mora no apartamento da frente tem cara de estar na casa dos 40, já beirando os 50. A vizinha do lado aparenta 30 e poucos e, julgando por suas músicas, tem mesmo: acorda escutando Like a Virgin ou Blitz... Eu tô aqui com meus 26. Ou seja, temos uma diferença de uma década pra cada, mais ou menos.
Não somos amigas, mas eu já sei um bocado de coisas sobre elas e elas, se forem boas observadoras, também sabem umas certas coisas sobre mim.
A vizinha da frente tem um namorado. É um senhor baixo e meio careca, com cara de ter uns 50 e poucos. Assim como a namorada, não é de conversa. Os dois adoram trocar beijos estalados ali no corredor. Não é todo dia, mas os domingos são recorrentes. Ele vai embora depois das 10 da noite e, enquanto o elevador não chega, os dois ficam lá num beija-beija que, ao invés de me dar vontade de beijar, causa até um certo mal estar, dado a barulheira que o corredor insisti em fazer ecoar. Toda manhã ela recebe a Folha de São Paulo. Antes das 7 o jornal já está ali, mas às vezes ele fica em cima do capacho até bem depois do meio-dia e acho até que a assinatura talvez seja do namorado...
A moça do lado adora Coca-Cola normal e esvazia latas e latas e garrafinhas de 600ml toda semana. São dois sacos brancos de lixo reciclável cheios de latas e garrafas toda semana. Ela também adora pizza e comida chinesa e quase toda noite o moço da entrega aperta sua campainha. O cheiro às vezes é bem bom e horrível pra quem quer perder seus quilinhos a mais. Um casal de amigos sempre aparece por lá, mas vão embora cedo, antes das 10. Agora, parece que eles sumiram e tenho escutado alguns beijos vindos do corredor, encostados à minha porta. Acho que ela tá namorando também.
Resta a porta da minha sala. Ali ninguém tem saído à noite e recebido beijos antes de entrar no elevador. Também não tem capacho nem jornal na minha porta. Acho que é a porta mais triste e a única que ainda não tem uma guirlanda ou um Papai Noel. Talvez seja culpa dos 20 e poucos e da falta de crença que Papai Noel vá me trazer um bom presente este ano.

terça-feira, dezembro 07, 2004

Guardanapos e amigas

Em janeiro, três amigas que não se viam há mais de um mês sentaram-se numa mesa de bar pra várias rodadas de chopes e papos.
A conversa, que começou fria, teve muito de Sérgio, Ricardo e Pedro. Duas das amigas estavam apaixonadas e à outra restava falar de alguém das férias para não ficar sem falar nada, na condição pouco favorável de tecer comentários ácidos às duas amigas.
Num certo momento (em que nenhuma das três poderia dizer que usufruía de sã consciência), sacaram guardanapos e canetas. Escreveram umas tantas coisas que chamaram de “Metas 2004”.
É espantadoramente interessante como cada papelzinho daqueles retrata sua dona!
Hoje são meus, por usucapião, mas nenhum deles me pertence. Nem aqueles em que estão as minhas metas, não absolutamente cumpridas...

Começo por um guardanapo que, senão completo, pelo menos foi o mais cumprido.
Lá estava escrito logo abaixo de “Metas 2004”:
* Fazer pós.
* Pelo menos conhecer o homem pai dos meus filhos.

*

Não sei porquê o último item só simbolizado. Acho que ela percebeu que tinha tecido já metas grandes e melhor parar ali e ver nada realizado. Mas a dona das duas metas e um ameaço viu a primeira com chances de se tornar real menos de um mês após essa conversa. O pai dos filhos já não sei se conheceu (isso só os anos dirão ou não...), mas eu a conheço a ponto de saber que deveria mesmo não estar no estado normal, pois se assim tivesse, o grifo estaria no artigo “o”, talvez até escrito em letra maiúscula, bem mais a seu estilo. Se fosse assim, O homem para ela, parece que apareceu.
Foi uma história difícil, que ainda é (história e difícil). Sem felizes para sempre, o fim até agora é de romance: cada um em um canto, vivendo do que viveram, sem os problemas da rotina que eles (talvez) tanto queiram.
Às vezes penso que, fosse diferente, a história e seus personagens perderiam os plurais e tudo poderia virar um “cri-cri” sem fim...

Mas se comecei pelas “2 metas e um ameaço”, vou pro outro extremo, onde fica a meta extensa, rabiscada em grandes letras de palavras compridas e não cumpridas.
* Ficar noiva.
* Terminar o mestrado.
* Entrar no doutorado.
* Arrumar um emprego – não um trabalho.
* Comprar um carro novo.
* Comprar um apartamento.

O ano não acabou, mas parece que dessas metas aí só uma será definitivamente cumprida até que chegue o dia 31.
Acho que os sonhos foram muito altos para o curto tempo de um ano.
A dona “das 6” é assim: sonha alto com vontade real, mas parece às vezes se esquecer de que, embora fundamental, a vontade não pode ser a única... e, se bem que determinada, não soube determinar o que seria colocado em papel e guardado até o final do ano, no prazo das coisas se darem por fim...

Restam as minhas. E como sei o que pensava no dia em que escrevi no guardanapo, digo que usei de trapaça! Das três, duas são incentivos necessários e reforçados por estarem no papel, a outra é necessidade incentivada quando se viu figurada ali também no papel.
* Qualificar.
* Poupar grana.
* Emagrecer 5 kg.

Tinha que qualificar: era isso ou “cai fora!”, mas decidi ficar: meta atingida. Mas também precisava poupar grana e queria emagrecer.
Na verdade até cumpri as duas últimas, mas é que guardei o dinheiro por pouco tempo, até o momento em que batiam as fúrias consumistas, e aí ele se foi... Também emagreci esse ano. Devo ter emagrecido uns 7 kg, é verdade, mas, ao mesmo tempo, engordei uns 8, o que dá um saldo de 6 kg a serem perdidos em 2005.

O que acho engraçado nisso tudo é o quanto se sabe destas moças por suas metas... Sonhadora, realista, racional, trapaceira, sei lá! O fato é que colocaram desejos no guardanapo sem saber se eram metas ou objetivos...
Aí, outro dia, li no Chalmers que “para serem úteis, e não fúteis, as metas não podem ser utópicas. Devem ser tais que se possa constatar um avanço em sua realização.” Foi então que acho que vi mais claro: muitas das metas dos guardanapos não eram metas, eram mesmo objetivos. Envolvem muitos fatores e não são capazes de serem atingidos tão facilmente e somente porque a gente tem vontade de tê-los...
O que deve contar, no fim das contas, é que, sendo objetivos ou metas, tentamos fazê-los e sentimos que talvez não dessem, que necessitariam de mais tempo... Mas aí já era tarde e pra isso, também, é que sempre vão existir as amigas, os papos, chopes e guardanapos...

quarta-feira, dezembro 01, 2004

Na carteira

Para quem não sabe, fica aqui o registro: Andradas é a terra do vinho.
Hoje em dia acho até que o título não é mais justo, mas há tempos atrás se vivia da produção do vinho, do cultivo da uva e da degustação da bebida por aquelas bandas do sul de Minas.
Hoje, grande parte da uva vem do Sul do país e mesmo o vinho às vezes é comprado de lá. Chega em Andradas e se engarrafa o que foi feito por descendentes de alem~es e se vende o produto como algo legítimo da terra do vinho.
Porque era a terra do vinho, criaram uma tal de Festa do Vinho. Sempre em julho, ela coincidia com a época em que o produto ficava pronto depois de terem começado a fabricá-lo por volta de janeiro, época da panha da uva.
A primeira Festa do Vinho foi em 1954 e teve direito ao então governador de Minas, Sr. Juscelino Kubitschek, indo lá pra Andradas pra cortar a faixa, dançar com a rainha, beber uns copinhos de vinho e distribuir uns prêmios que uma certa comissão julgou que eram devidos. Conta a história que minha família ganhou um desses troféus. Não sei bem ao certo em qual categoria foi, mas é certo que não foi pelo próprio vinho... Parece que foi de melhor decoração da barraca (que àquela época não era chamada de stand, talvez porque as pessoas não ficassem paradas em uma só... mas isso já é especulação). Sei só que minha família lá estava presente na primeira Festa do Vinho, talvez a única verdadeira Festa do Vinho que já se teve em Andradas.
Depois o negócio cresceu e as pessoas foram indo pra lá, e construíram um tal de Pavilhão do Vinho onde eram os shows e onde se comprava uma caneca e se bebia o vinho que quisesse e agüentasse (não na mesma ordem, é claro).
Sei que me lembro da Festa quando, em criança, a gente esperava o ano todo para que, na segunda quinzena de julho, montassem lá na Vila Mosconi uma extensa e diversa feirinha, no melhor estilo camelódromo.
Nós, crianças, adorávamos a Festa do Vinho por causa das barraquinhas. A gente não tinha mesada (que em Andradas isso nem era necessário), mas minha mãe dava uns tostões pra gente e nos acabávamos lá na feirinha. Não era muita grana, então a pesquisa era absurda e a gente às vezes ia várias vezes à feira só pra pesquisar e só comprava o que queria no último dia da Festa. Eu achava uma delícia!

Lembro bem que em um ano lá quis ter uma carteira. Achei uma linda no camelódromo. Era toda vermelha, da OP, e com fecho de velcro. Fazia aquele ttttsuuu, quando a gente abria. Queira muito a carteira. Pesquisei e pesquisei, mas o preço era o mesmo em toda a feira.
O dinheiro que eu tinha recebido da minha mãe não dava pra compra-la, mas eu queria tanto, e falava tanto da carteira, que minha mãe disse que completaria.
Então eu tinha o dinheiro pra comprar o que queria. Mas qual a serventia da carteira se, depois de tê-la, o dinheiro para colocar lá dentro já tinha ido embora?
Pois é... fiquei no dilema por quase uma semana, mas decidi por comprar a carteira. Tive ela por muito tempo... às vezes meu pai me dava um dinheiro pra ir até o bar do lado de casa buscar o cigarro dele e eu colocava o dinheiro na carteira só pra poder tira-lo da carteira na frente de todo mundo, no meio do bar. Era uma delícia ver todo mundo me olhando quando a carteira cantava seu ttttsuuu!
Sei que valeu mesmo a pena gastar todo aquele dinheiro na carteira.

Hoje lembrei dela porque vi o quanto ainda sou a mesma: não que tenha faltado dinheiro pra pôr na carteira (também não tem sobrado, deixo claro...), a verdade é que desde que comprei esta carteira virtual aqui, parei de ter idéias e de viver coisas que me agucem a vontade de escrever uma boa história... Por isso a carteira tem andado meio vazia. Espero que agora elas (coisas e idéias) estejam voltando, e que sejam minhas, porque não consigo depender do que somente me emprestam pra colocar aqui.
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