Seu Ricardo
Era dia dos pais.
Não por isso, mas porque era domingo, fomos para a roça amontoar o café que secava no terreiro.
Sob o sol forte das 2 da tarde, logo me cansei e as bochechas avermelharam.
O café quente queimava meus pés descalços enquanto eu puxava, com um rodo de metal, montes de grãos para o ponto marcado com a linha da leira.
Foi meu vô quem marcou. Ele que, do alto de seus 88 anos, continuava ereto, firme e sério mesmo que o sol forte o castigasse como devia estar.
Ele acompanhou o trabalho todo. Comandando, rodando, falando, e o tempo todo impávido.
Acabada a tarefa, cada um para um canto e o vô ali, contando histórias, nossas velhas conhecidas, para um amigo da minha prima que conhecia Andradas no fim de semana.
Enquanto isso, fui para dentro da casa com a Marina. Ela queria separar umas fotos bem antigas e acabamos achando também uns vinis, vários papéis, escrituras e recibos de impostos, livros de reza e uns móveis antigos, mas ainda firmes.
Quando o vô veio ver as fotos que a gente tinha levado para fora, perguntamos sobre uns bancos de madeira que vimos em um dos quartos. Como não se lembrava, nos chamou para mostrarmos a ele.
Dos bancos, não se lembrou mesmo. Nem fez muita questão, é verdade. Mas quis ir pro outro cômodo onde ainda tem a estrutura em madeira de uma velha cama, um móvel com gaveta e porta e uma velha arca.
Já conhecia histórias sobre aquela arca: tinha vindo da Itália com os pertences de meus bisavós, virou baú por aqui e fui útil por muito tempo. Só não sabia que aquela arca era uma das personagens de uma das histórias que meu vô mais gosta de contar e que eu mais gosto de ouvir.
Num certo dia de julho, meu vô com 3 anos e pouco, sua mãe o coloca em cima da arca para vesti-lo depois do banho. Ele diz que era como uma camisola, a roupa de crianças à época. Sua mãe está chorando. Em italiano, ele fala: “Por que você chora?” “Choro porque minha mãe morreu.”.
Meu vô, que permaneceu forte sob o sol da tarde, nesta hora se sentou sobre a arca.
O rosto sério.
As palavras em ritmo compassado e tranqüilo como de costume pararam por uns instantes como se ele se lembrasse daquele dia.
Então falou de novo. Contou que naquela cama ali haviam morrido seu pai e sua mãe. Que o pequeno móvel de porta e gaveta era onde se guardava dinheiro e documentos. Falou sobre os esforços de seus pais e de tantos outros imigrantes de Andradas. Falou que os tempos foram difíceis para todos, mas que não podia reclamar: fora criado a pão de ló. Depois se levantou e caminhou rumo à porta. Marina e eu atrás, quietas, olhando com respeito e admiração para toda aquela grandeza que não cabe no corpo de 1,90m de nosso avô.
Não por isso, mas porque era domingo, fomos para a roça amontoar o café que secava no terreiro.
Sob o sol forte das 2 da tarde, logo me cansei e as bochechas avermelharam.
O café quente queimava meus pés descalços enquanto eu puxava, com um rodo de metal, montes de grãos para o ponto marcado com a linha da leira.
Foi meu vô quem marcou. Ele que, do alto de seus 88 anos, continuava ereto, firme e sério mesmo que o sol forte o castigasse como devia estar.
Ele acompanhou o trabalho todo. Comandando, rodando, falando, e o tempo todo impávido.
Acabada a tarefa, cada um para um canto e o vô ali, contando histórias, nossas velhas conhecidas, para um amigo da minha prima que conhecia Andradas no fim de semana.
Enquanto isso, fui para dentro da casa com a Marina. Ela queria separar umas fotos bem antigas e acabamos achando também uns vinis, vários papéis, escrituras e recibos de impostos, livros de reza e uns móveis antigos, mas ainda firmes.
Quando o vô veio ver as fotos que a gente tinha levado para fora, perguntamos sobre uns bancos de madeira que vimos em um dos quartos. Como não se lembrava, nos chamou para mostrarmos a ele.
Dos bancos, não se lembrou mesmo. Nem fez muita questão, é verdade. Mas quis ir pro outro cômodo onde ainda tem a estrutura em madeira de uma velha cama, um móvel com gaveta e porta e uma velha arca.
Já conhecia histórias sobre aquela arca: tinha vindo da Itália com os pertences de meus bisavós, virou baú por aqui e fui útil por muito tempo. Só não sabia que aquela arca era uma das personagens de uma das histórias que meu vô mais gosta de contar e que eu mais gosto de ouvir.
Num certo dia de julho, meu vô com 3 anos e pouco, sua mãe o coloca em cima da arca para vesti-lo depois do banho. Ele diz que era como uma camisola, a roupa de crianças à época. Sua mãe está chorando. Em italiano, ele fala: “Por que você chora?” “Choro porque minha mãe morreu.”.
Meu vô, que permaneceu forte sob o sol da tarde, nesta hora se sentou sobre a arca.
O rosto sério.
As palavras em ritmo compassado e tranqüilo como de costume pararam por uns instantes como se ele se lembrasse daquele dia.
Então falou de novo. Contou que naquela cama ali haviam morrido seu pai e sua mãe. Que o pequeno móvel de porta e gaveta era onde se guardava dinheiro e documentos. Falou sobre os esforços de seus pais e de tantos outros imigrantes de Andradas. Falou que os tempos foram difíceis para todos, mas que não podia reclamar: fora criado a pão de ló. Depois se levantou e caminhou rumo à porta. Marina e eu atrás, quietas, olhando com respeito e admiração para toda aquela grandeza que não cabe no corpo de 1,90m de nosso avô.
2 Comments:
Lu, acabei de ler este o o post da hora marcada p minha mãe... acho q vamos ter q aumentar o número das caixinhas de lenço...
Lúcia Helena, seu avô não cabe em 1,90 porque ele é um dos últimos homens de 7 metros que eu conheço. Sem contar que é palmeirense, adora um bom vinho e... inspirou meu nome.
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